domingo, novembro 14
sábado, agosto 28
Erros
Deveríamos ser superiores a tais coisas e somente crer na magnificiência do Homem, na sua existência, nas suas capacidades e assim aceitar sem desordem a estrutura psíquica que condiciona a ordem do espaço. O contraponto situa-se sobre a verdade e o receio de ser, pois o erro facilmente se maniupla e se extingue, mas a verdade, a verdade excluí, repugna e afasta.O erro sustenta-se pela superficialidade enquanto a verdade repousa nas entranhas de cada um,tanto que não basta uma vida para a aceitar, no erro chega o arrependimento ou simplesmente o desgaste do tempo.
sexta-feira, agosto 20
Obrigada
Amo te (mesmo que entre nós nasçam as ervas daninhas que o tempo teima em semear, mesmo que a distância seja o motor que sustenta o nosso laço, enquanto formos eternas separadamente continuarei a cultivar a crua admiração que abrigo de ti)
quarta-feira, agosto 18
03.46h
Não quero personagens, pseudónimos, eventuais explicações. Quero ser eu, Andreia Silva, sem truques ou ilusões.
Assim como se aprende a ler pela leitura, assim como se aprende a escrever pela escrita, também se deve aprender a amar pelo amor.
Talvez esta seja a maior resolução e a grande surpresa do minha desconfiança pelo amor.
Preciso de o aprender pelo acto e a experiência e não apenas teorizando sobre as eventuais casualidades a que o mesmo obriga.
É isso. Preciso de amor, de amar e de o sentir não por hábito mas por medo, pela sensação que evoca, pela adrenalina que desponta. Irracional? Pois que seja, Doentio? Assim o recebo. Fugaz? Pois que chegue mesmo que o cronómetro espreite a todo o instante.
terça-feira, agosto 10
(Re) Pensamentos
É difícil suportarmos-nos. O peso de nós invade-nos o tutano e somos forçados a encontrarmos uma razão, um sentido ou simplesmente um mero pretexto para a banalidade dos dias.
Há dias pensei ter escrito sobre os malefícios da diabólica influência, a tal que nos manipula inconscientemente e nos conduz à perda da autenticidade, conceito pelo qual sempre manifestei um apreço e sobre o qual tento alienadamente construir-me. Não obstante fui confrontada comigo e num duelo de gigantes sofri com a derrota de ser pelos outros. Afinal as influências não são nocivas mas antes necessárias. A extensão alargada a que estamos sujeitos permite-nos ser e crescer, e por conseguinte a iludirmos-nos da necessidade dos outros. Não é puramente uma ilusão mas um elixir, o cálice que nos eleva a humanos e nos atribui caracteristicas únicas como os sentimentos. Confrontados com a razão também estes parecem deixar de fazer sentido pois não pode haver razão no egoísmo, no medo, no amor. É isso. Ninguém os poderia explanar concretamente num dicionário de bolso porque estes não são feitos de razões mas de inconsistências, são potenciais adubos que nos ajudam a crescer e a ver o mundo para além do mapa que nos mostram na escola. Por tudo isto comecei a dar espaço à importância das influências, à necessidade dos preconceitos, à obrigatoriedade das esperas e dividas. Recuso-me a ceder ao deleite dos preconceitos, a restringir-me às ideias ditadas, aos estereótipos erróneos, aos bloqueios cognitivos que muitos usurpam para justificarem o ego. Todavia também eu necessito de lhes abrir a porta, caso não o fizesse estaria mais perdida do que me apresento na estrada que se estende. Ficaria sem limites, ultrapassaria ignorante os conceitos relativos de bem e mal e extinguir-me-ia num sopro infinito. Isto porque todos os príncipios que julgo formar a minha consciência são baseados em preconceitos, em frases ditas e acções reaprendidas. Caso contrário baixaria a guarda a leviandade e nenhum dos ópios oferecidos seria por mim negado, nenhum sentimento me faria hesitar na dor alheia, nenhuma espera cobrada seria para mim um desafio e todas as expectativas morreriam com o fim dos dias.
segunda-feira, julho 12
8h, 14ºC, Metro
Então saio do velório que prossegue sem tempo para chegar ao destino. No Rossio, sento-me no banco soalheiro da praça e reflicto sobre tudo isto. Não é estranho que todos o façam, é difícil imaginar muito para além da visão, é difícil procurar diferenças quando tudo nos expele para a massificação, mas sobretudo é me difícil não pensar nisto. Bem sei, que aqui sentada, nada mais sou, que um corpo para os que passam, e mesmo eles nada representam para mim, porque estou neste estado, num estado de reflexão. Dói-me pensar nisto, esta humanidade perdida, pensar nós connosco. Porque me sinto só, tão só que nem mesmo o fluxo de transeuntes que estagnam junto das portas automáticas do metro me fazem sentir acompanhada. E isto não me seria tão doloroso se não soubesse que é fruto da vontade megalómana de ultrapassar a banalidade dos dias. Não faço nada, não me mexo, sou cúmplice da vergonha que me espelha, então escrevo. Escrevo porque não sei fazer mais nada, porque mais ninguém vê para além da camisa às riscas, escrevo porque preciso de gravar a minha tradução dos pensamentos, e ainda assim sei que as palavras não vão a lugar nenhum. E por vezes nem escrevo, porque as ideias emergem súbitas e refém do comodismo e da própria apatia deixo-me escrever em mim, e mesmo na virgindade que possuem tornam-se velhas, as percepções ficam maduras, enegrecidas, podres, porque na verdade não transpareceram a verdadeira pureza. Mesmo isto, foi pensado ainda sentada no banco do Rossio, e sem coragem para enfrentar o deserto branco da folha corri para a estação. Ainda faltava passar no supermercado, pagar o totoloto, levantar as toalhas na lavandaria… E sem tempo para atormentações sigo a passo veloz. É o eterno protelar de nós, é a insistência para nos tornarmos lacónicos, quando na realidade somos lunáticos, uma loucura tão inconsequente que para mim não passa de folhas não escritas.
segunda-feira, junho 28
A Revolta dos Ignorantes
Talvez fossem apenas alucinações - concluiu. Ela tivera a triste sina de se diagnosticar, e num fatídico auto-exame, a realidade de ser doente deixara-a inconsolável. Não, este não é o grande problema, porque no desconsolo ainda há movimento, aparentemente ela perdera-os todos. Crente da sua inutilidade, na busca por coisa nenhuma, nos factos evidentes de que a sua existência não possuía quaisquer indícios, Olga deixou-se acometer pela estranha sensação de já estar morta. Descobriu, entre os lunáticos pensamentos, que sofria da doença terrífica que não pressupõe cuidados médicos, ainda que o ópio pudesse ser uma possível cura. Mas ela sabia que seria impossível haver cura, que nem todas as drogas a fariam estar eternamente livre do peso de existir sem viver.
Estou cansada de pensar, pensar no que seria e não aceitar o que é. Estou farta de romances de suspense e acções literárias que não se adivinham. Exausta de coisas descobertas e ainda assim nada me satisfaz. Permaneço nesta dormência crónica de escrever por pensamentos e não os fazer viver pelos registos. Eu quero escrever, muito mesmo. E, não imagino um outro destino que não este. Na realidade escrevo todos os dias, nos momentos em que cogito, ou seja, a todo o instante. Todavia não consigo passar disto, do pensamento. Então não descanso, porque não possuo o botão off da mente, e pela caneta pode sempre secar a tinta. Mas não consigo ou não quero, porque a validade está nos actos e não nas intenções. E sinto-me aterrorizada por, talvez, nunca conseguir... porque permito que a banalidade dos dias ultrapasse as ideias sonhadas. Enquanto me distraio com a vida prática não me demoro com a pureza dos pensamentos alienados. Porque, a bem ver, eu vejo-me ali, sentada só, em permanentes confrontos com o deserto branco da folha, ou mais correctamente, com o ecrã limpo do computador. Imagino-me em esforço alargado para produzir, a viver na pressão inimaginável de quem quer ser mais sendo e não apenas desejando. Poderá a inércia fazer de mim um mero resto de tudo isto? é indecente, mas fora de ilusões quero ser muito mais que o senhor que se senta do meu lado no BUS, quero ser uma inspiração e não somente uma memória particular de alguém, mesmo que isto de mim faça um ser isolado. É megalómano, sim, mas é puro e não tão efémero quanto eu desejaria. (...)
e as que aquilo, mas eu estou aqui, incluída neste grupo que não parece deixar-me. Na realidade, a Humanidade entristece-me, as pessoas deprimem-me. Então porque perco tanto tempo com estas lamentações idiotas? Possivelmente porque escondo o anseio de mudança, porque sei que não há nada que mais almeje do que transformar a Humanidade. E mesmo quando digo que sim, quando sorrio e confirmo a comunhão das realizações, mantenho escondido o desejo interior da revolta. Porque quero gritar que não, porque quero ter a coragem de dizer CHEGA. Mas depois num flash de conformismo a comodidade atrapalha-me e demoro-me mais um pouco nesta ilusória resignação. Isto não é difícil, nem complicado, nem coisa nenhuma. É somente doentio e obsessivo. Ah, então é isso, sou obcecada, doente. Incrivelmente ninguém vê. Estou aqui, como poderia estar em qualquer outro lugar, a doença assume repetidamente perante mim, normalmente sobre atormentações dolorosas. Porque a bem ver nada disto tem razão de ser. Pois a olho cru a sociedade ditou as regras, e entre o realismo e idealismo fico eu, com a mente confusa, com as ambições trocadas, ou simplesmente sem nada. É fácil saber-se o que não se quer, é tão fácil, porém é cómodo ter algumas certezas, mesmo que ínfimas, e quando todas parecem evaporar a desilusão inunda-nos. Primeiro a alma, depois o corpo e ficamos vazios. Sentimo-nos ocos porque isto é estranhamente libertador. NÃO CONSIGO ESCREVER MAIS.
Não em admira que aquela mulher tenha afirmado convictamente que "Quem não tem dinheiro não tem alma". Não me admira mas corrói-me. Corrói por saber que gastamos as intermináveis horas a labutar no sentido de o obter, que quando permanecemos na preguiça da procura a alma vicia-se no deleite e o hedonismo apodera-se do corpo, então ela passa a exigir o cumprimento de todos os prazeres carnais, tornando-os negociáveis e dependentes da moeda. Estarei também eu condenada a isto? Não é realmente um dilema, mas se não me deixo enganar pela falsa conquista
do dinheiro com que fico? Com uma alma inundada de tudo, com um sistema neurológico baralhado e debilmente só. Recordo-me que também o Pessoa sofrera estes males, que em revoltas com a tolice cognitiva se houvera apercebido que todos estes devaneios são o caminho da loucura. Mas é difícil escolher-se entre ser-se um ser social ou permanecer-se solitário, sem ninguém e sem nada. A questão é que não me parece haver escolha, esta crise nem se coloca. Na verdade não quero abdicar disto, desta dormência crónica que não me deixa dormir. Mas também não quero morrer só. Terei eu, tal como ele, o triste fim de viver resignada a uma garrafa de vinho barato e um reles cigarro? Por tudo isto não me vejo na velhice, não me vejo doente, cansada, estéril. Não me consigo imaginar na necessidade dos outros, na ajuda alheia, porque me habituei a isto do retiro. Talvez terminarei num asilo, e confundida com os dementes serei apenas mais um a quem a vida nada fez, possivelmente por ter estado ao algo dela. Preciso desesperadamente de sensações, mesmo que mínimas, mesmo que fugazes.
Mesmo com esta realidade pairando sobre a consciência não produzo, não produzo nada, vítima ou culpada do cansaço. Tenho que fazer valer alguma coisa e mesmo que nada valha, conforta-me a ideia de te ter feito. Outra das questões é esta ideia idiota da aprovação anónima, pois provavelmente tudo isto é fruto do reconhecimento nulo, se calhar tudo se deve à correspondência das expectativas. É completamente justa a ideia da vida quotidiana, porque não ter objectivos é como não viver, é existir por existir e consequentemente não se ser nada, nem mesmo os aforismos nos salvam. Enquanto se investe no trabalho, ou no ideal financeiro, acredita-se na procura de qualquer coisa, justifica-se a actividade, enquadra-nos no espírito mundano. Como queria não pensar, desejo arduamente desligar-me, tornar-me imbecil, fútil, oca. Para não penas nas predisposições e/ou consequências. Fazer porque sim sem denotar um lado contrário.
Assim sendo, vou fazendo notar-me pelas atormentações mentais, mas nem aí sinto a verdadeira entrega, em nenhuma delas. Não me concentro nem no trabalho nem nas horas póstumas, então esta seja a grande resolução de todas as palavras idiotas anteriormente escritas. Não há entrega em nada. Tal como a demora inconsciente dos anos que fingimos encobrir pelas rugas do rosto, assim são as queixas, autênticas farsas.
Andreia Silva
quinta-feira, maio 27
Por Detrás da Janela
sábado, abril 17
Relatividades
Detesto meios romances. Mais que isso, não suporto relações. E isto não acontece por nenhum motivo em especial, mas apenas porque não acredito que existam.
Ainda assim leio Tristão e Isolda, sossego-me destas determinações e permaneço embebida por coisas inexistentes. Espreito a janela e não vejo ninguém. É hora de ponta mas não vejo ninguém. Demoro-me mais um pouco encostada ao vidro frio e penso em ti. Porque não acredito em nós e não nos vejo no futuro. Apetece-me somente este terno presente em que não somos um do outro mesmo quando nos entrelaçamos, chega-me sentir esta proximidade realista que não adiciona ilusões. Bem sei que amanhã talvez não sejamos mais, que provavelmente o nós se desvanecerá com as horas do relógio e eu ficarei onde sempre estive, junto da janela.
Não precisas de me sussurrar baixinho que ficarás comigo, muito menos dares-me a mão quando juntos vemos o Tejo. Não quero. Dá-me só este sopro de vida hoje, enquanto não me recordo do depois.
sábado, abril 10
Retiros (um poema que ecoa)
Dores alternadas
(...)Se não puder mais que pensar em ti
deixo que se me gaste o pensamento
a reduzir sentido por sentido
letra por letra o alfabeto o só
com que nos entendemos
Porque sou o percurso banal
de todos os pensamentos
feito à conta de esquecer
os que de pensamento se tornaram irrealizáveis
E se te tirarem a nossa máscara?
Guardarei o molde na parede que se me esvai
no sabor a lagos distantes com peixes esquecidos
e penso em ti
Quis soprar o pó e apaguei
E sou ridículo por adivinhar-te
nos minutos que gastam pó pelas minhas janelas
(...)
Fernando Lemos
sábado, março 20
Tenho pensado incansavelmente em deixar-te, em conceder-te liberdade para seguires, para te ver a evaporar de mim. É difícil. De tantas noites sem dormir acordo febril. É então que chegas devagarinho e me afagas as bochechas, desalinhas-me o cabelo e te enrolas em mim como selvagens que somos. Talvez eu perceba os meus contemporâneos, talvez consiga alcançar a dimensão do que dizem porque não te posso mostrar a ninguém. Tornou-se difícil definir a tua espessa barba, os desobedientes caracóis e as veias que teimam em sobressair. Dizem que estou louca, que o martini me embebedou a alma e o raciocínio e até os cigarros me embaciaram o olhar. Mas que dizem eles? Sinto-me quando estou contigo, quando ouço os teus passos no meu quarto.
Costumo ouvir os discos que juntos comprámos, por vezes imagino-te comigo a dançarmos de peito encostado. Mas tu não estás, nunca estás. Gelam-me os ossos quando num repente de verdade me apercebo que nunca estiveste.
O doutor veio cá a casa, diz que estou doente e o melhor será “tratar-te”. Proibiu-me o martini e os cigarros, aconselhou-me livros e filmes antigos.
É para lhe ocupar o tempo. – Diz descaramente. E deixo-me sossegada nos nossos lençóis. Quem pela janela passa nada mais vez que um enfermo. Mas eles não sabem. Não sabem que me sugaste a enfermidade pelos lábios, que em mim depositaste o vício da tua presença e agora nem a inércia me impede de ti. Em cima da mesinha ficou a receita desumana para te afastar de mim. Experimento uma cápsula, duas, três. Adormeço e ao acordar não te vejo mais.
Malditos comprimidos.
Eu sei que és impossível. Que foi a obsessão de ti que te criou. Sei que quando te avisto na entrada do nosso quarto é a sombra dos candeeiros que vejo. Que quando fazemos amor sou eu que me toco de forma obscena. Que quando acordo e encontro os lençóis desalinhados vejo a necessidade de ti, sentida na noite anterior. Então engulo-os todos, todos de uma só vez sem piedade de te perder. Porque sem ti nada mais sou que um corpo. Já nem mesmo o brandy me satisfaz e os cigarros não sabem a coisa nenhuma. A casa perdeu os móveis, as cortinas e até os nossos discos. Consumimo-nos sem pudor e possuís-me uma última vez. No lado de fora, para lá do jardim e das tulipas continuam os contemporâneos e as suas teorias. E nós, nós meu amor ficamos, mesmo depois de nós nada restar.
sábado, fevereiro 27
Insónia
Sim, eu sei, nunca quis ser nada. No recôndito da diminuta alma descobri o desejo de voar e agarrei-o. Algemei-o no meu peito com a crença de que seria, por ventura, distinta. Sempre o quis. Ansiei violentamente libertar as amarras do enclausuramento humano para me pintar de melodias escritas e sonetos de liberdade. Cobicei ser alguém na imensidão do sombrio espaço que enlaça e sufoca com as infortunadas recompensas que outorga. Foi como um sonho em que os limites indecifráveis pela transparência que encerram, em que o fim é inequivocadamente ilusório e a incalculável extensão humana é dada como a certeza da flecha que trespassa o coração. Ao longo de noites intermináveis enquadrei na moldura ideais revolucionários e sentenças implacáveis, e foi nisto que auto retratei imaculados dons.
Sabes, imaginei-me dolentemente, gravemente, enlouquecida deste estro idilico e em repentinos acessos de loucura achei-me transformada nessa gente, e o mundo parecia pequeno. Não procures questionar estas adulteradas divagações. Na verdade, (como gosto desta expressão, na verdade) elas não existem, são meramente fantasiosas e colhidas das raízes maduras da imaginação. A compaixão abomina-me e as condolências alienadas dos curiosos itinerantes aterrorizam. Eu, que tantas vezes me achei só, sou desconhecedora da solidão, o ensurdecedor silêncio ainda permanece um enigma indecifrável. Sim, eu quis ser desses poetas apaixonados e incompreendidos que não se deixam acometer pelas palavras, genuinamente fugazes. Tornou-se possível tatuar esta maqueta padronizada que outrora chamaram mundo. A crença de que o revestiria levou-me a padecer das mazelas orgânicas e na balada nocturna confiei o meu ser, a capacidade de me libertar de tudo o que pudesse comprometer esta cerrada ambição converteu-se em fachada. Sou parte da humanidade e de uma certa forma isso entristece porque me faz recuar. Rasgaria a pele para não me fragilizar, de espírito limpo expurgaria as influências maliciosas e voaria. Não haveria recanto onde não pudesse estar nem presente que me prendesse. Somente ele, só o desconhecimento pelos lugares inóspitos me alimentaria a iludida alma. É vil a razão, puxa com a violência de um turbilhão endiabrado e não nos deixa partir. Talvez tenha sido eu quem usurpou a mascara para esconder o que temia, a banalidade é a defesa de quem ainda não se desfez da bagagem. Acreditei poder alcançar as infindas latitudes, que pensei respirar versos e fazê-los florir em poemas. É uma estranha idade, esta, a dos sonhos, em que os lírios cobrem os campos de luz e a vida corre sem contrariedades. É a ténue visão da efemeridade da juventude, a composição dos timbres festivos. Teria reunido as munições necessárias caso a cobardia infantil não inflamasse os olhos e por isto seria natural se nunca o desejasse ser.