São 7h da manhã. O frio lá fora cobre as janelas e deixa o rastro do nevoeiro. Parece tal e qual o dia em que nos vimos pela última vez. Ainda te lembras? De certo não. Porém eu não me esqueco. Não me esqueco um só dia e penso que nunca me esquecerei.
Não sei se terás previsto o meu futuro, mas consegui um bom emprego e finalmente concretizei um dos meus maiores sonhos: o desejo de ser pai. Sim, tenho duas filhas, lindas, e tenho esperança que talvez um dia as possas conhecer. Ainda me pergunto o que será feito de ti, imagino-te no velho cadeirão da sala a dormitar ao som do criptar da lareira. Estarei certo? Acredites ou não sinto a tua falta. A cada dia que passa, a cada manhã que enfrento lembro-me de ti e reconheço a dor interminavel da ausência. Lembro-te constatemente, a toda a hora, sobretudo na minha filha mais nova ela tem os teus caracóis.
Aqui na cidade é tudo tão diferente do nosso campo, aqui as pessoas não se conhecem, vive-se mais virado para o horário do próximo autocarro do que propriamente para o companheiro de espera. Imagino que devas estar a pensar na cidade como o "outro mundo", era assim que a chamavas. Nunca percebeste muito bem como funcionava o mundo para lá da nossa cerca. Nunca julgaste existir mais do que a nossa família e a nossa harmonia. Infelizmente existe e ambos tivemos a prova.
Para fora da minha casa adivinho como estás e recordo com tristeza o pior dia da minha vida. Se pudesses prescutar a minha dor tenho a certeza que a partilharias comigo. Não é triste ambos sabermos como erramos, e mesmo assim nehnhum de nós ter a coragem para fazer um simples telefonema? E pensar que na altura em que parti nem telefone havia para essas bandas. Foi a prima Alzira que me deu o número da nossa casa, e ele ali continua, escondido entre a agenda da mesinha e a minha memória. Decorei-o assim que o li, talvez aches estranho mas penso que a vontade humana esconde muito mais do que algum dia se possa estudar.
Eu sei que ficaste a pensar o que me aconteceu depois da discussão que tivemos. Eu sei que ainda hoje ouves ao longe os gritos e as acusaçãoes que trocamos. Não tenhas medo eu também as oiço. Após a nossa separação saí enfurecido e conduzi, conduzi até não aguentar mais, não sabia para onde ir mas mesmo assim conduzi. Parei ao fim de quase trÊs horas e adormeci á beira da estrada. Felizmente a Mariana estava comigo e evitou algo pior. Ao amanhecer voltei a acordar, tinha os olhos inxados e mais 1000 kg de culpa na cabeça. Vomitei apesar de não ter jantado e segui sem uma única palavra rumo a Lisboa.
A Mariana é uma mulher incrivel continua comigo e vivemos felizes. Ela sabe como tem sido insuportavel conviver com os remorsos, e todos os dias me incentiva a procurar-te, mas o estúpido orgulho e o medo da negação faz-me perder a coragem, faz-me sentir culpado e destroí-me. Talvez nunca perca este medo que me aprisiona, mas acredita que não guardo qualquer rancor das duras frases e das injustas acusações, apenas recordo-te com amor, com todo o meu amor. E possivelmente quando o medo me libertar e a coragem florir tu já não estarás sentada no teu cadeirão, mas continuarás sempre presente em mim. Nunca te conseguirei agradecer por ser o que sou e continuarei a lembrar-me constantemente de ti perdida nos caracóis da tua neta...
Com todo o amor, do sempre teu Carlos
P.S: Adoro histórias e como tal não faria sentido não escrevê-las e posta-las
2 comentários:
Minha qerida De,
Tive a ler o blog todo e gostei muito. Mas gostei especialmente deste post... É tão lindo. Adoro estas histórias que têm um final surpreendente, mas que ao mesmo tempo esteve sempre lá...
Gostava de saber se foste tu que escreveste esta história, de ter a certeza, porque gostei muito.
Ainda vou deixar mais um comentário no último post, por isso não me adianto mais.
Beijo,
Tani
Querida Tani. Antes de mais muito obrigada pelos comentários e fico feliz que tenhas gostado. Sabes duvidei se o havia de criar ou não, e se te dizer que já tinha tentando paí umas 5 vezes vais perguntar pk n o fiz. Ás vezes penso que é um pouco parvo da minha parte criar um blog sem o divulgar percebes? Mas eu acho que podemos desfrutar de todos os meios para sermos autênticos, eu nunca sube muito bem o que fazer para libertar o que quiser, acho que nunca tive muita vontade ou coragem. A história fui eu que escrevi, adoro criar personagens e através delas relacioná-las com pessoas reais...bjo
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