sexta-feira, setembro 21

O dia depois de ontem


São 7h da manhã. O frio lá fora cobre as janelas e deixa o rastro do nevoeiro. Parece tal e qual o dia em que nos vimos pela última vez. Ainda te lembras? De certo não. Porém eu não me esqueco. Não me esqueco um só dia e penso que nunca me esquecerei.

Não sei se terás previsto o meu futuro, mas consegui um bom emprego e finalmente concretizei um dos meus maiores sonhos: o desejo de ser pai. Sim, tenho duas filhas, lindas, e tenho esperança que talvez um dia as possas conhecer. Ainda me pergunto o que será feito de ti, imagino-te no velho cadeirão da sala a dormitar ao som do criptar da lareira. Estarei certo? Acredites ou não sinto a tua falta. A cada dia que passa, a cada manhã que enfrento lembro-me de ti e reconheço a dor interminavel da ausência. Lembro-te constatemente, a toda a hora, sobretudo na minha filha mais nova ela tem os teus caracóis.

Aqui na cidade é tudo tão diferente do nosso campo, aqui as pessoas não se conhecem, vive-se mais virado para o horário do próximo autocarro do que propriamente para o companheiro de espera. Imagino que devas estar a pensar na cidade como o "outro mundo", era assim que a chamavas. Nunca percebeste muito bem como funcionava o mundo para lá da nossa cerca. Nunca julgaste existir mais do que a nossa família e a nossa harmonia. Infelizmente existe e ambos tivemos a prova.

Para fora da minha casa adivinho como estás e recordo com tristeza o pior dia da minha vida. Se pudesses prescutar a minha dor tenho a certeza que a partilharias comigo. Não é triste ambos sabermos como erramos, e mesmo assim nehnhum de nós ter a coragem para fazer um simples telefonema? E pensar que na altura em que parti nem telefone havia para essas bandas. Foi a prima Alzira que me deu o número da nossa casa, e ele ali continua, escondido entre a agenda da mesinha e a minha memória. Decorei-o assim que o li, talvez aches estranho mas penso que a vontade humana esconde muito mais do que algum dia se possa estudar.

Eu sei que ficaste a pensar o que me aconteceu depois da discussão que tivemos. Eu sei que ainda hoje ouves ao longe os gritos e as acusaçãoes que trocamos. Não tenhas medo eu também as oiço. Após a nossa separação saí enfurecido e conduzi, conduzi até não aguentar mais, não sabia para onde ir mas mesmo assim conduzi. Parei ao fim de quase trÊs horas e adormeci á beira da estrada. Felizmente a Mariana estava comigo e evitou algo pior. Ao amanhecer voltei a acordar, tinha os olhos inxados e mais 1000 kg de culpa na cabeça. Vomitei apesar de não ter jantado e segui sem uma única palavra rumo a Lisboa.

A Mariana é uma mulher incrivel continua comigo e vivemos felizes. Ela sabe como tem sido insuportavel conviver com os remorsos, e todos os dias me incentiva a procurar-te, mas o estúpido orgulho e o medo da negação faz-me perder a coragem, faz-me sentir culpado e destroí-me. Talvez nunca perca este medo que me aprisiona, mas acredita que não guardo qualquer rancor das duras frases e das injustas acusações, apenas recordo-te com amor, com todo o meu amor. E possivelmente quando o medo me libertar e a coragem florir tu já não estarás sentada no teu cadeirão, mas continuarás sempre presente em mim. Nunca te conseguirei agradecer por ser o que sou e continuarei a lembrar-me constantemente de ti perdida nos caracóis da tua neta...


Com todo o amor, do sempre teu Carlos



P.S: Adoro histórias e como tal não faria sentido não escrevê-las e posta-las

2 comentários:

T. Geiroto Marcelino disse...

Minha qerida De,
Tive a ler o blog todo e gostei muito. Mas gostei especialmente deste post... É tão lindo. Adoro estas histórias que têm um final surpreendente, mas que ao mesmo tempo esteve sempre lá...
Gostava de saber se foste tu que escreveste esta história, de ter a certeza, porque gostei muito.
Ainda vou deixar mais um comentário no último post, por isso não me adianto mais.
Beijo,
Tani

Anônimo disse...

Querida Tani. Antes de mais muito obrigada pelos comentários e fico feliz que tenhas gostado. Sabes duvidei se o havia de criar ou não, e se te dizer que já tinha tentando paí umas 5 vezes vais perguntar pk n o fiz. Ás vezes penso que é um pouco parvo da minha parte criar um blog sem o divulgar percebes? Mas eu acho que podemos desfrutar de todos os meios para sermos autênticos, eu nunca sube muito bem o que fazer para libertar o que quiser, acho que nunca tive muita vontade ou coragem. A história fui eu que escrevi, adoro criar personagens e através delas relacioná-las com pessoas reais...bjo