Há sempre dias que nem sempre são dias. O sol surge insistentemente mesmo nos dias que não são dias. E a noite, a enigmática escuridão parece prolongar-se e assim ficar durante mais tempo que o suposto tempo. Um dia dei por mim a pensar quanto tempo o tempo tem, e a mais nenhuma conclusão cheguei a não ser a de quem tem o tempo que o tempo tem. Dito assim, isto parece ter sido retirado de um monólogo alienado, mas na realidade pensar nisto prova que questionamos a verdadeira noção da duração temporal e a sua representação mundana. À medida que o tempo por nós passa e a casca se torna mais densa a consciência aviva-nos de que a eternidade é algo que só ressurge ficticiamente, e isto é algo que só floresce quando a juventude nos parece tão alheia e distante que acabamos por percepcionar algo que incrivelmente se manifesta como exterior e esquivo. Eu não consigo definir o tempo, não somente por ser um conceito relativo, porque sei que quando o tempo parece mergulhar uma parcela espacial na escuridão, num outro ponto uma outra renasce, mas por não saber exactamente a definição de tal conceito. O meu tempo não funciona como o tempo alheio, quando para mim ainda o dia sobrevive para outro já a noite se estendeu e não falo apenas do tempo temporal, isto é, a duração que o teimoso relógio insiste em marcar mas aquele que me foge por entre os dedos e que me acompanha no rosto e na alma. Porque envelhecer não é simplesmente uma questão estética é algo imanente e incontrolável. Muitas vezes a velhice chega sem a maturidade, e em outras já a maturidade é tão consistente que a velhice não penetra na carne. E por vezes é necessário ser-se velho para se admitir a brevidade da vida. Então podemos observar os quadros temporais, e admitirmos que as memórias são os vincos do presente e os sinais do futuro, é uma constante corrente impossível de discernir. É muito mais que a constante mudança de estações e a renovação da Natureza, ultrapassa os ponteiros do relógio e os dias demarcados no calendário. Somos nós, é o Universo. É de tal modo relativo que num ano pode ter-se vivido menos que num dia. E mesmo sem controlo as pessoas tendem a organizar o tempo por acontecimentos e sucessões temporais gradativas, menos óbvio é que o mesmo tempo que definha os animais e as plantas não embate de modo tão incomplexo no Homem, pois em tantos momentos me sinto fraquejar pelas forças incapazes do meu corpo e em outros tão jovial que pareço não ter reminiscências e me torno tão incoerente e liberta que nenhuma das datas de que sou feita parecem subsistir em mim. Mas eu também sou feita de datas, as que me marcam e me fazem, e sobretudo as que identificam os outros perante mim, não é somente um dia é um momento, uma duração. Só me possibilito fazer este balanço porque o tempo me permite fazer comparações, e os sonhos que outrora foram meus hoje nada mais significam do que pó, o pó que me cobriu e se entranhou de tal modo que nem eu mesma reconheço que um dia já tive aquela ambição. E se não houvesse tempo então o Homem permaneceria eternamente na escuridão, e as memórias são alicerces e professores que nos ensinam a comandar o presente À luz do passado, então eu não posso duvidar da utilidade do tempo e sobretudo do seu valor. Enquanto padeço das incongruências do tempo num outro ponto alguém se apercebe da sua carência e insuficiência. Um conceito abstracto e tão potencialmente condicionante, se devemos acreditar somente naquilo que nos é palpável e visível sendo portanto algo que existe, então nós, tolos humanos estamos submetidos a algo que não existe e que tão grande influência acarreta sobre nós.
É incrível que quando pensamos no tempo e no presente tudo parece ter sido demasiado rápido, e no entanto quando olhamos para o passado já a maturação dos dias demonstra ser demasiado longínqua. É uma ambiguidade desconcertante e incerta e particularmente ilógica. Eu não sei significar o tempo nem atribuir-lhe uma missão terrestre. Apenas sou consciente de que sem tempo eu não seria nada. O que não implica que para mim haja dias que nem sempre são dias simplesmente porque o sol ainda dorme. Poderia dizer mais mas no entanto o meu tempo para este post chegou ao fim.
"O tempo constitui a mais profunda dimensão existencial do Homem, está ligado à própria existÊncia, portanto tem um começo e um fim que é a morte, o aniquilamento da existÊncia." Mircea Eliade
Um comentário:
Eu queimo o tempo e sou velha. Felizmente, em algum ponto de todos essem tempos queimados, eu sou a juventude, a vida, que não liga ao tempo, não sabe o que é o tempo. Infelizmente, esse ponto, como tudo o resto,tem o seu tempo, tem duração finita.
Amor, tu sabes-me - e sabes-me tanto e comigo ajudas-me a saber de mim própria, nas nossas conversas, ou até mesmo nos teus textos que me dizem sempre tanto. És a voz das pessoas que não existem por terem medo de existir; as tuas palavras dão corpo à alma de quem não quer viver neste tempo e que tem sonhos de mais - mas que também tem vontade.Mas tu, tu fazes, tue és DETERMINADA. E cresces tanto.
Voltarei a ler este post com mais calma e atenção para poder reflectir melhor sobre ele.
De resto, está soberbo.
bjo,
Tânia
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